Entrevista com Ricardo Duchesne: Parte I: O que é Multiculturalismo? Primeira pergunta
- Traduzido por Carolus M.
- 30 de abr. de 2017
- 5 min de leitura
Ricardo Duchesne é sociólogo e professor canadense da Universidade de New Brunswick. Seus principais interesses de pesquisa são a civilização ocidental e a ascensão do Ocidente. Em seu trabalho principal de 2011 "A singularidade da Civilização Ocidental" ele critica o que ele vê como os efeitos destrutivos do multiculturalismo sobre a cultura ocidental.
Duchesne é um crítico veemente do multiculturalismo e do politicamente correto na academia. Desde a publicação de seu livro de 2011, Duchesne tem argumentado que a interpretação multicultural do Ocidente faz parte de um esforço mais amplo das elites estabelecidas para criar sociedades heterogêneas de etnias misturadas dentro de todas as nações criadas pela Europa através da promoção da imigração em massa. Duchesne também critica o conservadorismo mainstream por defenderem a ideia de que a identidade política ocidental se baseia apenas em valores democráticos liberais universais que são verdadeiros para todos os seres humanos. Ele argumenta que o liberalismo é exclusivamente ocidental e que a identidade ocidental também está profundamente ligada ao caráter étnico dos europeus. Mais recentemente, Duchesne tem trabalhado nas origens greco-romana da identidade cívica ocidental, ao mesmo tempo em que questiona a afirmação estabelecida de que essa ideia unicamente ocidental de identidade cívica impede uma identidade étnica, um sentido de lugar territorial, identidade étnica e ancestralidade.
Devido a grande importância dos estudos de Duchesne em argumentar em favor do caráter étnico como fator central para a construção da Civilização Ocidental, vimos como sendo imensamente positivo dedicar um espaço para ele em nosso blog. A seguir, publicaremos uma entrevista realizada pela revista Le Harfang divida em duas partes, com cada uma contendo cinco perguntas e respostas, que serão publicadas em postagens separadas. Desejamos boa leitura a todos. Le Harfang: Devido ao fato de sua definição estar sempre atrelada a quem está falando, poderia por favor definir em suas próprias palavras o que significa multiculturalismo?
Ricardo Duchesne: Em primeiro lugar, comecemos pela palavra “multicultural” ao invés de “multiculturalismo”. “Multi” significa muitos, de modo que “multicultural” significa muitas culturas. A partir de um ponto de vista estritamente etimológico advindo de um dicionário, não há nada de errado com o termo “multicultural”; pode ser corretamente utilizado descritivamente ao se referir à presença de muitas culturas no mundo.
O termo também pode ser usado de forma normativa, indicando uma apreciação positiva da presença de muitas culturas no mundo, do fato de que os povos da terra habitam diferentes nações com diferentes culturas e, neste sentido, a palavra pode ser usada de modo a reconhecer e validar a diversidade cultural do mundo.
A palavra também pode ser utilizada para descrever a atual presença de mais de uma ou duas culturas ou grupos linguísticos dentro de uma nação ou império. O Império Austro-Húngaro, por exemplo, era multiétnico e multicultural, povoado por alemães, húngaros, italianos, romenos, checos, poloneses, ucranianos, eslovenos, sérvios, croatas, eslovacos e ciganos. A antiga “União Soviética” foi possivelmente o país mais etnicamente diverso, somando mais de cem diferentes etnias vivendo dentro do mesmo território.
O Canadá também pode ser descrito como uma nação multicultural durante o curso de sua história. Examinando o censo de origem étnica em 1971, podemos encontrar a seguinte distribuição étnica: Aborígene (1,3%), Britânica (44,6%), Francesa (28,7%), Alemã (6,1%), Italiana (3,4%), Ucraniana (2,7%), Asiática (1,3%).
Contudo, o termo “multiculturalismo” com o “ismo” deve ser diferenciado da palavra “multicultural”. O multiculturalismo é melhor definido como uma ideologia. E por ideologia, quero dizer um conjunto de ideias formuladas em um programa cujo propósito é transformar a configuração atual em uma nova realidade que se submeta à ideologia. Multiculturalismo, neste sentido, não é um termo descritivo que se refere à presença de múltiplas culturas em determinada sociedade. Não é sequer uma avaliação normativa da existente configuração da sociedade. Ao invés disso, é de fato um programa social e político que pretende criar uma nova realidade cultural.
O termo “multicultural” foi utilizado para descrever determinadas sociedades antes da ideologia do multiculturalismo ser amplamente divulgada na década de 1970. Apenas a partir dos anos 70. Por quê? Isto nos leva a um segundo componente contido no termo multiculturalismo; em que este se desenvolveu como um programa juntamente com a decisão das elites liberais do Ocidente de abrir suas fronteiras para imigração em massa de não-ocidentais. Até a década de 1960, as grandes nações de colonos europeus como Canadá, Austrália e Estados Unidos eram protegidas por políticas de “Imigração de Brancos”. A motivação principal por trás dessas políticas excludentes estava fundamentada no desejo coletivo destas nações em permanecerem britânicas e/ou europeias em sua etnia e instituições. Vale enfatizar que essas nações eram “multiculturais” tanto em diversidade de colonos europeus quanto na existência de pequenas porções de não-brancos. Mas nenhuma delas, fundamentalmente, praticaram multiculturalismo.
O então presidente americano Lyndon B. Johnson assinou o Ato de Imigração de 1965 que acabava com a exclusão de imigrantes não-brancos e, após dois anos, o Canadá adotou as Regulações de Imigração de 1967, que também impuseram critérios de admissão não-raciais para imigrantes, e seis anos mais tarde a Política Austrália Branca chegou ao fim. O resultado foi um aumento exponencial de imigrantes não-brancos nestes três países nas décadas seguintes. A adoção do multiculturalismo deve ser enxergada neste contexto diante da decisão de parte das nações Ocidentais em promoverem imigração em massa da Ásia, África e América Latina. O multiculturalismo nunca foi uma política sobre a composição multiétnica do Canadá, Austrália e dos Estados Unidos. Até os anos 70, todos esses países eram majoritariamente brancos. Canadá, por exemplo, era em torno de 95% europeu em 1971. A mudança para um sistema multiculturalista no Canadá não foi sobre o passado ou o presente, e sim um programa ideológico dedicado à transformação do Canadá – e eventualmente de toda a Europa – em meros locais para todas as etnias e culturas do mundo.
Já que o Canadá, Austrália e Estados Unidos ainda eram majoritariamente europeus nos anos 60 e 70, a promoção do multiculturalismo como ideologia precisava de uma diversificação da população, causando então um aumento no fluxo de imigrantes do Terceiro Mundo. O tão falado contraste entre a “panela de mistura” (melting pot) americana e o “mosaico” canadense perderam qualquer significado substancial após a mudança das políticas de imigração. Antes dos anos 70, o Canadá era um mosaico de franceses e ingleses dentro de uma Confederação. Do mesmo modo, os EUA eram uma panela no que diz respeito à assimilação de vários povos étnico-europeus com um histórico similar a um objetivo comum: o “Sonho Americano”.
Até hoje, nos EUA, negros e indígenas não se assimilaram bem à cultura europeia, mesmo com os esforços de ações afirmativas. O governo e a mídia louvam a “integração”. A panela funcionou apenas quando os ingredientes eram imigrantes europeus. Atualmente, com a entrada em massa de mestiços e asiáticos, cada vez menos a mistura da sopa na panela tem resultado num sabor satisfatório. Os EUA não estão mais protegidos do multiculturalismo que o Canadá. Enquanto os americanos não têm uma política oficial de multiculturalismo a nível federal, os canadenses possuem uma infinidade de políticas de “diversidade” e programas a nível estadual e municipal regulando grades curriculares, policiamento, práticas de contratação e políticas de relações raciais. Certamente, todos os países europeus, em diferentes modos e graus, aceitaram a imigração multicultural: neutralidade étnica em políticas imigratórias e a imposição de diversidade étnica em instituições públicas e na mídia.
LE HARFANG. Interview with Ricardo Duchesne: Part I: What is Multiculturalism? Council of European Canadians, 2014. Disponivel em: <http://www.eurocanadian.ca/2014/08/ricardo-duchesne-interview-what-is-multiculturalism.html>. Acesso em: 23 Abril 2017.

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