Robert Putnam sobre os efeitos negativos da diversidade
- Traduzido por Bertram Schweickert
- 2 de nov. de 2017
- 10 min de leitura
O artigo de Robert D. Putnam "E Pluribus Unum: Diversidade e Comunidade no Século XXI" (2007) deveria ser leitura obrigatória para esquerdistas multiculturalistas.
Do resumo:
"A diversidade étnica está aumentando nos países mais avançados, impulsionada principalmente por aumentos acentuados na imigração. A longo prazo, a imigração e a diversidade provavelmente terão importantes benefícios culturais, econômicos, fiscais e de desenvolvimento. No curto prazo, no entanto, a imigração e a diversidade étnica tendem a reduzir a solidariedade social e o capital social. Novas evidências dos EUA sugerem que em bairros etnicamente diversos, os moradores de todas as raças tendem a se isolar. A confiança (mesmo da própria raça) é menor, o altruísmo e a cooperação comunitária são raros, os amigos menos. No entanto, no longo prazo, as sociedades de imigrantes bem sucedidas superaram essa fragmentação criando formas novas e transversais de solidariedade social e identidades mais abrangentes. As ilustrações de ficarem confortáveis com a diversidade são tiradas das forças armadas dos EUA, das instituições religiosas e das ondas anteriores da imigração americana."
Putnam (2007: 137) começa questionando como o aumento da diversidade étnica e do multiculturalismo no mundo ocidental afeta a coesão social, ou o que Putnam chama de "capital social", em termos de "reciprocidade e confiabilidade" sociais.
Níveis elevados de coesão social (ou capital social) levam a sociedades com resultados muito melhores em relação a tudo, desde os resultados econômicos, sociais, de saúde e até de felicidade (Putnam 2007: 138).
Putnam é, naturalmente, um liberal multiculturalista: ele acha que a imigração em massa e a diversidade étnica são desejáveis e um bem social a longo prazo (Putnam 2007: 138). No entanto, Putnam argumenta que, a curto prazo, a imigração em massa e a diversidade rompem a coesão social e inibem o capital social (Putnam 2007: 138). Examinemos a análise de Putnam sobre a diversidade étnica e suas conseqüências negativas abaixo:
(1) Putnam (2007: 141-142) primeiro observa que a "hipótese de contato" (amada pelos liberais) sustenta que a diversidade aumenta a tolerância interétnica e a solidariedade social.
Infelizmente, diz Putnam, a maioria dos estudos empíricos refuta a "hipótese de contato" e, de fato, fornece evidências para a "Teoria do Conflito": esta que diz que
"a diversidade promove a desconfiança extra-grupo (i.e., grupos diferentes desconfiam de si) e a solidariedade intra-grupo (pessoas do mesmo grupo são mais confiantes entre si). Sobre esta teoria, quanto mais nos aproximamos de pessoas de outras raças ou origens étnicas, mais nos aderemos aos "nossos" e menos confiamos no 'outro'." (Putnam 2007: 142).
Putnam cita uma impressionante gama de estudos em apoio a Teoria do Conflito como segue: Blumer 1958; Blalock 1967; Giles e Evans, 1986; Quillian 1995 e 1996; Brewer e Brown 1998; Taylor 1998; Bobo 1999; Bobo e Tuan 2006.
A seguir, Putnam conclui que mesmo a "Teoria do Conflito" não está exatamente correta. Mas suas próprias conclusões e teses são mais fracas do que a "Teoria do Conflito", como veremos abaixo.
(2) Em termos de grupos de trabalhadores, quanto mais a diversidade interna dos grupos aumenta (seja em termos de idade, etnia, etc.), mais inferior será a coesão do grupo e menor satisfação. Putnam cita provas dos EUA e da Europa: Jackson et al. 1991; Cohen e Bailey 1997; Keller 2001; Webber e Donahue 2001.
(3) Evidências de muitas nações mostram que, à medida que a diversidade étnica aumenta, mais confiança social cai (ver Newton e Delhey 2005, Anderson e Paskeviciute 2006). Ainda pior, estudos empíricos relacionados com as regiões locais dos EUA, Austrália, Suécia, Canadá e Grã-Bretanha mostram que o aumento da diversidade étnica é acompanhada pela queda da confiança social e, às vezes, até mesmo pela queda do investimento em bens públicos (ver Poterba 1997; Alesina et al., 1999; Alesina e La Ferrara 2000, 2002; Costa e Kahn 2003; Vigdor 2004; Glaeser e Alesina 2004; Leigh 2006; Jordahl e Gustavsson 2006; Soroka et al., 2007; Pennant 2005).
(4) Até mesmo no Terceiro Mundo a diversidade traz efeitos negativos. Estudos mostram que, no Paquistão, com o crescimento de diversidade religiosa e entre clãs, esta diversidade é seguida do fracasso na manutenção da infra-estrutura coletiva (ver Karlan 2002; Miguel e Gugerty 2005; Khwaja 2006).
(5) Em experimentos comportamentais envolvendo coisas como os jogos Dilema do Prisioneiro ou Jogo do Ultimato, quanto maior diversidade de jogadores, mais os jogadores tendem a enganar e trapacear (ver Putnam 2007: 143).
(6) A partir de sua própria leitura das evidências, o próprio Putnam sugere que a diversidade crescente pode realmente diminuir a coesão social intra-grupo e a solidariedade extra-grupo, uma tese que ele denomina "Teoria Constritora" (Putnam 2007: 144). A evidência para isso é dada abaixo em (7).
(7) Putnam cita o "Social Capital Community Benchmark Survey", que foi realizado nos Estados Unidos em 2000 com um tamanho de amostra de cerca de 30 mil pessoas (Putnam 2007: 144).
Os resultados deste estudo são devastadores para o multiculturalismo liberal: mostra que, à medida que a diversidade aumenta em uma comunidade e a homogeneidade étnica é reduzida, a confiança inter-étnica cai (Putnam 2007: 147). Então, conclui:
"A confiança inter-étnica é relativamente mais alta em Dakota do Sul homogênea e relativamente mais baixa em São Francisco ou Los Angeles heterogêneos. Quanto mais etnicamente diversas são as pessoas de nossa vizinhança, menos confiamos nelas. Esse padrão pode ser doloroso normativamente, mas parece ser consistente com a Teoria do Conflito "(Putnam 2007: 147).
Ainda mais devastador é a evidência de que, à medida que a diversidade aumenta, mais pessoas tendem a desconfiar de seus vizinhos e até de pessoas como elas mesmas, do mesmo grupo étnico ou raça (Putnam 2007: 148-149).
(8) O aumento da diversidade étnica também leva a todos os tipos de outras consequências deletérias, da seguinte forma:
(1) diminui a confiança no governo e nos meios de comunicação;
(2) menor frequência de registro de votação;
(3) a expectativa decrescente de que outros providenciem cooperação necessária para ações coletivas;
(4) menos pessoas que participam de projetos comunitários;
(5) menos doação à caridade;
(6) menos amigos próximos;
(7) menos felicidade e percepção de menor qualidade de vida;
(8) mais desligamento do mundo e mais tempo passando assistindo televisão (Putnam 2007: 149-150).
(9) Em suma,
"A diversidade parece desencadear não somente divisão extra-grupo/intra-grupo, mas também a anomia (falta de objetivos e regras) ou o isolamento social. Em linguagem coloquial, as pessoas que vivem em ambientes etnicamente diversos parecem "isolar-se" - isto é, fechar-se como uma tartaruga" (Putnam 2007: 149).
Putnam conclui que essas descobertas sustentam sua própria "Teoria Constritora" das conseqüências negativas da diversidade (Putnam 2007: 149).
Ainda que a diversidade não aumenta necessariamente o ódio interétnico,
"os habitantes de diversas comunidades tendem a se retirar da vida coletiva, desconfiar de seus vizinhos, independentemente da cor de sua pele, afastar-se até mesmo de amigos íntimos, esperar o pior de sua comunidade e de seus líderes, se voluntariarem menos, doar menos para caridade e trabalhar em projetos comunitários com menos frequência, se registrar menos para votar, exigir mais reforma social, mas têm menos fé que podem realmente fazer a diferença e se sentam infelizes diante da televisão. Observe que esse padrão engloba atitudes e comportamentos, a ponte e a ligação entre capital social, conexões públicas e privadas. A diversidade, pelo menos no curto prazo, parece transformar todos nós em tartarugas. "(Putnam 2007: 150-151).
As descobertas também são verdadeiras independentemente da pobreza, desigualdade econômica ou da afluência de uma comunidade (Putnam 2007: 153, 157). Embora existam algumas diferenças, elas são verdades generalizadas até mesmo em relação a homens e mulheres, pessoas liberais e conservadoras, brancas e não-brancas, e até jovens e gerações mais velhas (Putnam 2007: 153-154).
Aumentar a diversidade per se (por si só) sempre parece ter o mesmo efeito negativo (Putnam 2007: 153).
Mais notavelmente, os efeitos negativos da diversidade são muito claros e significativos entre os liberais e progressistas também (Putnam 2007: 154), apesar do mito generalizado de que os liberais amam a diversidade. E, mesmo entre os jovens, a atitude um pouco mais receptiva à diversidade pode ser apenas uma fase passageira da vida (Putnam 2007: 155).
Embora Putnam não discuta o problema, parece bastante óbvio que quanto maior é a diversidade, mais provável que destrua as chances de uma sociedade socialista democrática, uma visão tão amada pela esquerda.
Em qualquer caso, o socialismo democrático requer uma alta confiança e, portanto, uma sociedade altamente homogênea. A diversidade é mais provável que reduza as pessoas a indivíduos atomizados e isolados, desconectados e desconfiados das pessoas ao seu redor.
Outra questão não presente no artigo de Putnam: as conseqüências negativas da diversidade também incluem uma redução da taxa de natalidade? Talvez influencie de alguma forma mínima ou não, mas é uma questão interessante, no entanto.
A guinada liberal de Putnam em tudo isso emerge a partir da p. 159 do artigo.
A longo prazo, argumenta Putnam, a América poderá superar os terríveis e divisores efeitos do aumento da diversidade étnica. Em primeiro lugar, ele parece endossar o modelo de assimilação do melting pot (caldeirão de mistura) do nacionalismo liberal como solução (Putnam 2007: 160-161).
No entanto, Putnam pisa em falso quando ele discute a história da imigração americana como modelo de como resolver o enigma da diversidade (Putnam 2007: 162). Na verdade, o grau de diversidade étnica na história americana é grosseiramente exagerado e fruto de mitos liberais. Antes da década de 1960, a maioria dos imigrantes eram europeus e principalmente cristãos (embora de diferentes denominações). Esses imigrantes eram de culturas europeias amplamente compatíveis e os efeitos negativos crescentes da diversidade na época (Putnam 2007: 162) foram mais facilmente resolvidos a longo prazo pelo modelo de assimilação do melting pot. Mas esse modelo pode não funcionar com culturas profundamente diferentes do Terceiro Mundo que a imigração em massa traz para o Ocidente hoje. Mais importante ainda, como o próprio Putnam observa, a era da imigração em massa para a América foi largamente interrompida de 1924 a 1964 (Putnam 2007: 162), para dar tempo à assimilação. Hoje, a imigração em massa é interminável, até acelerando, e não há nenhuma parada à vista.
Então, em suma, qual é a difícil evidência que Putnam pode providenciar que, a longo prazo, tudo fique bem com a aceleração da imigração em massa e da diversidade?
Bem, parece que tudo é baseado em um "palpite" que Putnam tem:
"No entanto, o meu palpite é que, no final, veremos que o desafio é melhor alcançado, não fazendo que "eles" se tornem "nós", mas sim criando um novo e mais amplo senso de "nós", uma reconstrução da diversidade que não elimina as especificidades étnicas, mas cria identidades abrangentes que asseguram que essas especificidades não desencadeiam a reação alérgica, "isolada". (Putnam 2007: 163-164).
Bem, desculpe, isso não é bom o suficiente. E se o seu palpite estiver errado?
A afirmação de que, a longo prazo, tudo vai ficar bem com o multiculturalismo e a imigração em massa não é senão ciência social baseada na fé. Na Europa, já vemos o fracasso e o início do colapso desta fé multicultural extrema.
Então, e se as críticas pessimistas da política de imigração em massa estão corretas?
Minha conclusão é a seguinte: a evidência parece clara que a obsessão da esquerda regressiva com a diversidade e a imigração em massa está prejudicando horrivelmente a possibilidade de uma visão efetiva social-democrata para o mundo ocidental com políticas econômicas heterodoxas à esquerda e, sobretudo, possibilidade de um socialismo democrático, o que implica uma alta confiança e, os esquerdistas gostem ou não, uma sociedade altamente homogênea.

Original: http://socialdemocracy21stcentury.blogspot.com.br/2016/09/robert-putnam-on-negative-effects-of.html
BIBLIOGRAFIA
Alesina, A., Baqir, R. and W. Easterly. 1999. “Public Goods and Ethnic Divisions,” Quarterly Journal of Economics 114: 1243–1284. Alesina, A. and E. La Ferrara. 2000. “Participation in Heterogeneous Communities,” Quarterly Journal of Economics 115: 847–904. Alesina, A. and E. La Ferrara. 2002. “Who Trusts Others?,” Journal of Public Economics 85: 207–234. Anderson, C. J. and A. Paskeviciute. 2006. “How Ethnic and Linguistic Heterogeneity Influence the Prospects for Civil Society: A Comparative Study of Citizenship Behavior,” Journal of Politics 68: 783–802. Blalock, H. M. 1967. Toward a Theory of Minority-Group Relations. John Wiley and Sons, New York. Blumer, H. 1958. “Race Prejudice as a Sense of Group Position,” Pacific Sociological Review 1: 3–7. Bobo, L. D. 1999. “Prejudice as Group Position: Microfoundations of a Sociological Approach to Racism and Race Relations,” Journal of Social Issues 55: 445–472. Bobo, L. D. and M. Tuan. 2006. Prejudice in Politics: Group Position, Public Opinion and the Wisconsin Treaty Rights Dispute. Harvard University Press, Cambridge, MA. Brewer, M. B. and R. J. Brown. 1998. “Intergroup Relations,” in D. T. Gilbert, S. T. Fiske and G. Lindzey (eds.), Handbook of Social Psychology (4th edn.). Oxford University Press, New York. Cohen, S. G. and D. E. Bailey. 1997. “What Makes Teams Work: Group Effectiveness Research from the Shop Floor to the Executive Suite,” Journal of Management 23: 239–290. Costa, D. L. and M. E. Kahn. 2003. “Civic Engagement and Community Heterogeneity: An Economist’s Perspective,” Perspectives on Politics 1: 103–111. Giles, M. W. and A. Evans. 1986. “The Power Approach to Intergroup Hostility,” Journal of Conflict Resolution 30: 469–485. Glaeser, E. and A. Alesina. 2004. Fighting Poverty in the US and Europe: A World of Difference. Oxford University Press, Oxford. Jackson, S. et al. 1991. “Some Differences Make a Difference: Individual Dissimilarity and Group Heterogeneity as Correlates of Recruitment, Promotions and Turnover,” Journal of Applied Psychology 76: 675–689. Jordahl, H. and M. Gustavsson. 2006. “Inequality and Trust in Sweden: Some Inequalities are More Harmful than Others,” Ratio Working Paper 106. Stockholm: Ratio. Karlan, D. 2002. “Social Capital and Group Banking,” Unpublished manuscript, Massachusetts Institute of Technology. Keller, R. T. 2001. ‘Cross-Functional Project Groups in Research and New Product Development: Diversity, Communications, Job Stress and Outcomes,” Academy of Management Journal 44: 547–555. Khwaja, A. I. 2006. “Can Good Projects Succeed in Bad Communities?,” Harvard University, Kennedy School of Government Working Papers. http://ksghome.harvard.edu/~akhwaja/papers/BaltNov06.pdf. Leigh, A. 2006. “Trust, Inequality and Ethnic Heterogeneity,” Economic Record 82: 268–280. Miguel, E. and M. K. Gugerty. 2005. “Ethnic Diversity, Social Sanctions and Public Goods in Kenya,” Journal of Public Economics 89: 2325–2368. Newton, K. and J. Delhey. 2005. “Predicting Cross-national Levels of Social Trust: Global Pattern or Nordic Exceptionalism?,” European Sociological Review 21: 311–327. Pennant, R. 2005. Diversity, Trust and Community Participation in England. Home Office Findings 253, Research, Development and Statistics Directorate. http://www.blink.org.uk/docs/ho_findings_diversity_trust.pdf Poterba, J. M. 1997. “Demographic Structure and the Political Economy of Public Education,” Journal of Policy Analysis and Management 16: 48–66. Putnam, Robert D. 2007. “E Pluribus Unum: Diversity and Community in the Twenty‐First Century. The 2006 Johan Skytte Prize Lecture,” Scandinavian Political Studies 30.2: 137–174. Quillian, L. 1995. “Prejudice as a Response to Perceived Group Threat: Population Composition and Anti-immigrant and Racial Prejudice in Europe,” American Sociological Review 60: 586–611. Quillian, L. 1996. “Group Threat and Regional Change in Attitudes towards African Americans,” American Journal of Sociology 102: 816–860. Soroka, S. N., Helliwell, J. F. and R. Johnston. 2007. “Measuring and Modeling Interpersonal Trust,” in F. M. Kay and R. Johnston (eds.), Social Capital, Diversity and the Welfare State. UBC Press, Vancouver. Webber, S. S. and L. M. Donahue. 2001. ‘Impact of Highly and Less Job-related Diversity on Work Group Cohesion and Performance: A Meta-analysis,” Journal of Management 27: 141–162.
Comments